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Por Mônica Granzo
Durante muitos anos, falar de tecnologia em procurement era algo restrito aos times de TI. Havia uma divisão clara: tecnologia era ferramenta, não pauta estratégica. Mas isso está mudando. E mudando rápido.
Hoje, a Inteligência Artificial deixou de ser apenas um diferencial competitivo e passou a fazer parte das decisões centrais dos negócios. A IA chegou ao board estratégico das empresas e procurement é uma das áreas onde essa transformação já mostra impactos concretos, principalmente em eficiência, produtividade e inteligência de dados.
Mas junto com essa mudança, surgem novos desafios. Alguns práticos, outros mais culturais. E é sobre isso que quero conversar aqui. Nos últimos tempos, tenho escutado muita gente da área de procurement — de gestores de compras a líderes de supply chain — e o que vejo é um cenário de transição.
A IA já provou seu valor, mas ainda há uma distância entre o que ela pode entregar e o quanto, de fato, está sendo utilizada com consistência pelas empresas. Esse texto é um convite à reflexão. Sobre mentalidade, sobre estratégia e, principalmente, sobre liderança.
Por que ainda resistimos à IA?
Na Smarkets, usamos IA para automatizar negociações, identificar oportunidades de saving, qualificar fornecedores, analisar riscos e apoiar decisões. Já ajudamos nossos clientes a economizar mais de R$ 1,2 bilhão. E mesmo com esses resultados, posso afirmar: esse não foi um caminho óbvio nem simples.
Nos primeiros anos, vimos resistência. Era comum ouvir que tecnologia era responsabilidade de outro departamento, ou que a decisão de compras deveria continuar 100% com o humano. E não discordo da segunda parte: é exatamente por isso que nossa IA não automatiza tudo. Ela sugere, aprende, organiza. Mas quem decide é o comprador.
Na nossa visão, a IA amplia as possibilidades desse ator essencial para a cadeia de suprimentos. Ela organiza os dados, sugere caminhos, antecipa cenários. Ou seja: a decisão continua sendo humana, mas a diferença é que agora essa decisão vem mais embasada, com mais eficiência e mais conectada com a estratégia do negócio.
Todo o nosso legado em IA é desenvolvido sobre as soluções da Microsoft, que além de ser investidora da Smarkets, é também fornecedora da infraestrutura de inteligência artificial que sustenta nossa operação — o que nos permite aliar escalabilidade e inovação com segurança, confiabilidade e compliance. Essa foi uma decisão pensada para garantir que a IA da Smarkets esteja alinhada às melhores práticas do mercado e às exigências de nossos clientes.
Quando a automação encontra a sala de reuniões
Recentemente, li um artigo publicado pelo MIT Sloan que resume bem esse cenário: “Apesar dos benefícios, negociações automatizadas ainda geram apreensão entre líderes, compradores e fornecedores.”
Essa frase me chamou atenção porque sintetiza o que vejo no mercado. A tecnologia está pronta. Os resultados já são visíveis. Mas a mudança cultural ainda caminha devagar.
A boa notícia é que já temos bons exemplos de como a adoção da automação pode gerar resultados tangíveis. O artigo cita empresas como Walmart e Google. Essas empresas escalaram a tecnologia para diversas categorias, desde mídia de marketing até entrega de pacotes de e-commerce. O Walmart, por exemplo, automatizou mais de US$ 7 bilhões em negociações, obtendo mais de 5% em valor adicional.
E negócios menores também começam a colher os benefícios. O artigo menciona a Walker’s Shortbread, uma empresa familiar escocesa com apenas cinco profissionais em procurement, que economizou de 1,5% a 7% em matérias-primas usando negociações automatizadas.
Ou seja: não é sobre ter uma estrutura gigantesca ou um orçamento bilionário. É sobre mentalidade, estratégia e boas práticas. Entender que a IA não é um extra, mas parte do core do negócio, é uma mudança de postura que aponta para a cultura empresarial.
Tecnologia, cultura e execução: um novo papel para a liderança
Falar de adoção de soluções disruptivas para gerar eficiência — mesmo que, no início, isso demande uma curva de aprendizado — faz parte de uma cultura de inovação.
Esse movimento coloca uma nova responsabilidade sobre as lideranças: pensar tecnologia não como projeto pontual, mas como capacidade estruturante. Não é preciso saber programar, mas é preciso entender como a IA impacta a forma como tomamos decisões, gerenciamos riscos, construímos relações com fornecedores e entregamos valor ao cliente.
Quando a IA entra no board, a função de compras sobe de patamar. Deixa de ser operacional para se tornar estratégica. Deixa de focar apenas no curto prazo para contribuir com as decisões que definem o futuro da empresa.
E aqui vai uma provocação: o que diferencia uma liderança preparada para essa nova realidade? Não é adotar as ferramentas mais caras ou usar as palavras da moda. É saber conectar tecnologia, cultura e execução.
Na minha visão, os executivos que mais vão se destacar nos próximos anos são os que tiverem clareza de propósito, capacidade de mobilizar pessoas e coragem para mudar o que precisa ser mudado. E é aí que mora o desafio (e a oportunidade) da liderança.
A pergunta que fica
Se você está liderando um time de compras, minha sugestão é simples: comece pelas perguntas certas. Onde estão os gargalos hoje? O que você ainda faz manualmente que poderia ser automatizado? Como garantir que suas decisões estejam amparadas por dados confiáveis? Quem são os parceiros que você pode envolver para começar essa transformação?
O que vejo cada vez mais em nossa área, tão habituada a apagar incêndios, é que com a tecnologia podemos fazer diferente. A transformação digital já está na sala onde as grandes decisões da empresa são tomadas. E quando a IA entra no board, compras deixa de ser suporte e passa a ser protagonista.
Mônica Granzo é Founder e CEO da Smarkets